Tum- Tum, Tum- Tum, Tum- Tum…

raposa_e_galinhas
A galinha tinha ido fazer um piquenique ao pinhal, na companhia dos filhos.
Estavam eles já à volta do bolo, quando lhes apareceu um raposo raposão.
– Ora viva a bela merenda – cumprimentou o raposo.
– Quer do nosso bolo? – perguntou a galinha, a medo.
– Quero o bolo e o acompanhamento – respondeu o raposo.
O que ele queria dizer a galinha percebeu, mas fez-se de tola:
– É só o que tenho. O resto já comemos, senhor raposo.
Ele não quis saber. Em duas dentadas deu conta do bolo todo.
– Agora, venham os pintos – disse, ainda de boca cheia.
– Os pintos, senhor raposo, não prestam para o seu apetite. São só penas e ossos. Se quer coisa de mais substância, talvez eu lhe sirva…
Pela salvação dos filhos as mães dão tudo.
O raposo estava pelos ajustes. Deixou os pintos em paz, que fugiram atarantados, e ficou com a galinha.
Meteu-a num saco, que trazia às costas, dizendo:
– Hoje tenho visitas, lá em casa, e uma galinha dá sempre jeito, ao jantar.
A pobre da galinha, aos tombos, dentro do saco, matutava na sua infelicidade.
Os filhos, tão miudinhos, que iam ficar órfãos… Ela, tão nova ainda, a servir de petisco a raposas e raposões…
– Mas há-de haver uma saída – pensou a galinha, que não era de esmorecer.
Com o bico foi descosendo uma costura do saco. O coração batia-lhe, tum-tum, tum-tum, tum-tum, num sobressalto de tambor.
Para sorte dela, o raposo resolveu descansar, a meio do caminho. Estava calor e ele refastelou-se, à sombra de um sobreiro.
Quando o sentiu a dormir, a galinha escapou-se. Mas, à cautela, meteu uma grande pedra no saco e, com artes de
costureira, voltou a coser a costura.
Depois, fugiu, ao encontro dos filhos.
Quase logo a seguir, o raposo acordou, cheio de fome, como sempre:
– Se não fosse ter visitas, começava o jantar mais cedo…
Para tirar daí a ideia, pôs-se a caminho. O saco pesava-lhe e ele contente:
– Está gorda esta galinha. Vai dar uma rica jantarada!
Raposos, raposas e raposecos esperavam-no.
– Trago a galinha mais gorda da capoeira. Ponham água a ferver ao lume, que quero cozê-la com arroz. Come-se
primeiro a canja e, depois, a galinha.
Quando a água do panelão estava a ferver, o raposo foi buscar o saco. Raposos, raposas e raposecos puseram-se à
roda do lume, para apreciar a qualidade do pitéu.
Abriu-se o saco e o pedregulho, ao cair na panela, esparramou água à volta, salpicando os convidados. Uivos
de dor, em coro desafinado, soltaram-se das bocas gulosas.
Depois foi uma algazarra, todos contra o raposo que, segundo eles, lhes tinha pregado uma feia partida. Acabou
tudo à bulha.
Em casa da galinha, de novo com os filhos, tanta alegria nem se descreve.
Na hora da deita, os pintainhos, aconchegados à mãe, adormeceram felizes. Até ela sentiu, no centro daquele
calor bom, o coraçãozinho deles a bater ao mesmo compasso sereno do coração dela, tum-tum, tum-tum, tum-tum…
E assim adormeceu.

FIM

(Da autoria de António Torrado)